quinta-feira, 3 de setembro de 2009

De kanjis

Pois bem, devido ao ritmo dos meus estudos recentemente, decidi enfim sentar e escrever, mesmo que brevemente, sobre a escrita japonesa (perdão pela repetição indevida de palavras). Sei que pode não ser o tópico favorito de muitas pessoas, mas achei que seria interessante ao menos apresentar esse conteúdo tão desconhecido e, até mesmo, vítima de certas mistificações por quem o desconhece. Confesso que, no início, eu também fiquei um pouco assustado com o volume de material e de exigência que o estudo do japonês exige; contudo, com a prática e o ritmo, tudo vai se assentando. Claro, eventualmente eu também me encontro à beira do desespero e da vontade de largar tudo e fazer algo mais fácil, como inglês ou francês, mas não teria metade da graça.
Comecemos do começo:

A escrita japonesa é originária da China com os ideogramas. Ao contrário de nossos amigos comunistas, contudo, o volume de caracteres no Japão é muito menor. Ao passo que, na China, o número de Kanjis usados chega a ser incalculável (e isso é verdade, não se tem ideia de quantas existam, apenas estimativas), o número de kanjis (o nome dos ideogramas) exigidos no Japão beira os 2.000. Pode parecer muito, mas, na realidade, é mais. Mesmo. O número de ideogramas oficiais é esse, mas, para se ler um jornal ou até alguns livros, seria necessário conhecer em torno de quatro a cinco mil caracteres.
O que poderia fazer alguém se sentir atraído por esse volume intenso de estudo? Loucura, provavelmente. Ou muitos episódio de Cavaleiros do Zodíaco quando criança. No meu caso, é a segunda alternativa :P
Prosseguindo: historicamente, não se tem noção clara de quando os caracteres chineses foram levados ao Japão, apesar de haver documentos datando do século V D.C. (provavelmente escritos pelos próprios chineses). Apenas no século VI D.C. é que se vê documentos escritos em caracteres chineses com interferência do japonês (um chinês misturado com japonês), indicando uso corrente da escrita.
Explicando brevemente, os ideogramas que compõem a palavra kanji (漢字) significam "escrita de Han"; esse Han seria o imperador chinês em cujo governo teria sido desenvolvida esta escrita. O porquê dos japoneses chamarem Han de Kan (daí "KANJI") não está claro, mas a teoria corrente é de que, na época, o japonês não tinha o som "han" (pronuncia-se ran) incorporado ao seu sistema fonético.
No caso da escrita na China, a cada ideograma corresponde um som com seu(s) respectivo(s) significado(s). No caso do Japão, como foi uma escrita adaptada, o furo é um pouco mais embaixo. No caso, a cada ideograma costuma corresponder um conceito, variando o som.
Podemos dar como exemplo inicial os números. Qualquer um que já tenha feito aula de judô ou karatê ou outra arte marcial japonesa deve ter aprendido a contar até, pelo menos, dez. Contemos, então:
ichi, ni, san, shi, go, roku, shichi, hachi, kyu, ju
A cada um destes números corresponde um kanji, certo? Aqui estão eles, em ordem:
一, 二, 三, 四, 五, 六, 七, 八, 九, 十

Pronto, agora vocês já podem escrever os números. São alguns dos kanis mais fáceis (do 1 ao 3, pelo menos).
Agora, para não ficar apenas na parte fácil, vamos complicar um pouco. O próximo kanji que vou mostrar se chama tsuki, que quer dizer lua. É um kanji bastante fácil, aprendido nos níveis iniciais, e é com ele que se escrevem os meses do ano. Podem adivinhar como se escreve? Fácil, fácil:
一月, 二月, 三月, 四月, 五月, 六月, 七月, 八月, 九月, 十月, 十一月, 十二月

Como se vê, o primeiro mês se escreve exatamente assim: como o kanji do número 1 junto do kanji do mês, e assim sucessivamente. Até os meses onze e doze são fáceis. Pega-se o kanji de 10 mais o kanji de 1 e voilá, 11. Como se pronuncia, então? Seguindo a lógica apresentada, o certo seria dizer ichi, que é um, e tsuki, que é lua, formando ichitsuki, correto?
Errado. Tsuki é apenas uma das leituras daquele kanji. Quando ele quer dizer lua, fala-se tsuki. Quando ele quer dizer mês, fala-se gatsu. Assim, janeiro é ichigatsu, fevereiro é nigatsu e assim por diante.

Passemos, agora, a outro kanji que pode causar ainda mais dores de cabeça: o de dia, ou sol. Um kanji tão simples, mas tão complexo. Sol e dia se escrevem da mesma forma em kanji (日), mas se pronunciam diferentemente. Sol é hi, e dia é nichi
Agora, passemos à verdadeira loucura.
O lógico, pelo que estou dizendo, seria fazermos o seguinte: quero dizer um dia. Portanto, pego o kanji de um e o kanji de dia, junto os dois e tenho ichinichi (一日). E está correto. Contudo, se quero dizer dia primeiro, eu uso os mesmos kanjis (一日), só que a pronúncia é levemente diferente. Fala-se tsuitachi (quando eu disse "levemente", estava sendo sarcástico), que é uma leitura especial. O mesmo acontece com dois dias. Pego o kanji de dois, junto com o de dia e obtenho ninichi (二日). Contudo, se me refiro ao segundo dia do mês, escrevo da mesa forma (二日), mas a leitura é futsuka.
Isso que estou dizendo pode parecer confuso, complicado e sem sentido (e no começo é mesmo), mas segue uma lógica de contagem em japonês. Em japonês, temos os contadores. Se quero duas maçãs (ringo), não posso dizer ni ringo, pois estaria errado. Devo usar o contador, que é futatsu. No caso, o contador de dias também começa com fu (futsuka), e esse padrão se repete. Por exemplo, o contador de três é mittsu (dia três se fala mikka); o contado de quatro é yottsu (dia quatro se fala yokka).
No caso, apenas para não deixar o exemplo pendente, para dizer: "quero duas maçãs", em japonês é: ringo o futatsu kudasai.

Aí vocês podem perguntar: e para que aprender um sistema tão complicado? No caso, até concordo que o sistem ocidental de escrita é muito mais simples. Contudo, o sistema de kanjis tem um poder de síntese e de ideias dentro da própria escrita que o sistem ocidental jamais vai ter. Por exemplo: avião (hikouki) se escreve 飛行機. Vocês podem não saber ler, mas alguém que não conheça a palavra, mas conheça os kanjis, poderá inferir o significado, pois se lê "máquina que vai voando".
Podem não gostar e torcer o nariz, mas temos que admitir que isso é, no mínimo, interessante.

Eu gostaria de escrever mais a respeito, mas não agora. O texto já está bem grande, e me permite escrever mais numa próxiam ocasião (quando eu falar da construção, dos componenetes e dos tipos de kanji). Além, é claro, dos kanas.
Ficou curioso? Então não perca! Na próxima quinta, nessa mesma bat-hora, nesse mesmo bat-blog!

9 comentários:

Hermes disse...

eita eita, depois eu vejo aqui!

Mas sobre o teu conto anterior, eu gostei sim. Muito legal o final, se não me engano era isso mesmo que eu não tinha gostado no anterior. É o tipo de texto que valeu a pena mudar, parabéns.

. disse...

Meeeu chapéu, é muito complexo mesmo! Mas muito interessante, com toda certeza. Deve ser fascinante depois que passa o pavor inicial.... =)

Como vai a vida, guri? Te vi esses dias passando pela frente da sala que eu tava tendo aula....

E como assim Sp, hein? Me conte essa história direito fazfavor... :p

bjs!

Marina disse...

Eu também via Cavaleiros do Zodíaco, mas via dublado em português, então não tive vontade de aprender japonês. Depois, quando comecei a assistir animes no computador, fiquei mais interessada. É um ótimo texto, para a gente conhecer.

Infelizmente, meu computador não está lendo os ideogramas. =/ Se isso não for uma queixa só minha, você podia colocar como imagens. Será que era por isso que você estava querendo saber sobre imagens? Eu mandei um e-mail.

Beijos!

Thiago César disse...

realmente, tudo q vem do oriente eh mil vezes mais interessante do q o q se tem no ocidente...
jah pensou em escrever um livreto sobre esses kanjis? eu compraria!
uahahuah!

CA Ribeiro Neto disse...

Primeiramente, parabéns pela entrada ao Blogs de Quinta!

Segundamente, obrigado pelos elogios a minha poesia.

Terceiramente, essa escrita é bem interessante, mas muito complicada... sem falar que eu sou muito Policarpo Quaresma... hehehehe

Abraço e vida longa ao seu blog!

Gerusa Leal disse...

Cara, que curso de japonês...rs Eu sou uma admiradora da cultura e da filosofia orientais, mas não sei se encararia mais um curso de japonês...rs Parabéns por não haver desistido da empreitada.

Sempre bom te ver lá pelo blog. Já imaginava que gostaria mais de A procissão:)

Essa capa, do Versilêncios, realmente, foi um achado. Quando eu fui à gráfica, não levei nada pronto, apenas uma idéia: eu queria uma capa que passasse o tom do livro, de silêncio, de ensimesmamento, de contemplação. Eu ainda não sabia concretamente o que queria, mas sabia o que não queria.

Os capistas/designers da gráfica me apresentaram duas propostas, a primeira, também belíssima, mas já descartei de imediato por trazer um excesso de informações gráficas, de "ruídos". A segunda senti como se eu tivesse desenhado, caso soubesse desenhar...rs Apenas dei alguns palpites mais na suavização das cores, queria mesmo algo sereno, clean. Então, foi assim que nasceu a capa de Versilêncios...rs

Beijos e brigada mais uma vez pela visita e pela apreciação dos meus escritos.

Vermeliasu disse...

eu faltei uma aula e você achou que eu ia largar? parece que não me conhece XDDD
na verdade eu falei pra sensei que eu ia faltar, aposto que ela esqueceu :B hoje to estudando o capitulo 27 pra nao ficar muito atrasada na aula de sexta.

alias, adorei esse post! eu nao sabia nada sobre a historia dos kanjis xD tu devia escrever mais sobre isso!

Pedro Gurgel disse...

Primeiramente, parabéns pela entrada ao Blogs de Quinta![2]

Segundamente, ADORO A CULTURA JAPONESA! Mas não entendo nada! =D

Mas e porque tenho uma grande afeição pelos animes e pelas artes-marciais!

Vivendo e aprendendo! O assunto é complexo, mas entendi tudo direitinho, e adorei o sistema!

Giovana disse...

confesso que quando vi o assunto do texto, achei que seria chato. Mas logo no começo engatinhei a leitura, vc escreveu de uma forma divertida e engraçada!

achei interessantíssimo, mas continuo sem a mínima vontade de aprender japonês ou qualquer outra língua oriental! ahahahaha
francês não é tão fácil como vc disse, essa língua já me exige um bom tempo em frente ao espelho tentando pronunciar o ''r''!! xD

quanto ao avião, que é máquina que sai voando, isso me lembrou alemão. Não sei se vc sabe, mas em alemão as palavras vão se juntando. Pires, por exemplo, é prato embaixo da xícara! eheheheheh

poderíamos inventar umas palavras assim para português, não acha? hehehehehhee

ah, só mais uma coisa. É, dentro dos blogs de quinta eu sou um pouco diferente mesmo dado o meu conteúdo... mas pelo jeito você tbm! esse post foi demais...